A identidade diz que ela nasceu homem, mas o coração só reconhece a mulher que existe naquele belo corpo feminino.
"A anatomia dita o destino". Esta frase de Freud é uma verdade incontestável. Com ela o velho mestre queria nos explicar que todos nós, homens e mulheres, somos dependentes de nossa fisiologia; que tendencias e propensões inatas tinham efeito sobre nosso comportamento e que essas propriedades eram diferentes em cada um dos sexos.
Já na puberdade afloram os traços femininos e ela passa a se identificar intimamente como menina. É um momento muito difícil, tanto para ela como para os pais. A mãe, a princípio pode não aceitar, mas acaba sendo vencida pelo amor maternal e o sentimento feminino que nunca lhe negara a realidade. O pai, com raras exceções, não aceita prefere ignorá-la ou até mesmo considerá-la como um filho que morreu.
O tempo passa e aquela menina se torna uma bela mulher. A identidade não mudou, mas é hora de enfrentar a vida como ela é.
Os primeiros constrangimentos começam na pré escola. Os colegas a olham com desconfiança e quando o estudo é sobre biologia - especialmente na questão da sexualidade - tudo fica extremamente difícil. Muitas nem conseguem assistir a aula e fogem assustadas para casa.
Ela sabe que é diferente, mas não entende o motivo. Para ela seu sexo parece uma aberração. Não consegue entender porque uma mulher pode possuir pênis. Mas é chegado o momento de decisão que determinará seu futuro.
Quando os pais não toleram, a filha acaba fugindo para as ruas e aí começa o grande sofrimento. Sem um teto para abrigo e uma mesa farta, o que lhe resta é viver como mendiga, cobrindo-se com jornais, papelões e catando alimento nas lixeiras em frente as lanchonetes. Na hora da higiene, sente falta do chuveiro quentinho de casa que é substituído pelo chafariz da praça ou alguma bica disponível. Voltar aos estudos é um sonho muito distante. O próximo passo é a prostituição e as drogas.
Mas existe também as meninas transexuais nascidas em famílias abastadas e liberais, cujos pais tem formação suficiente para entender o problema hormonal da filha e lhe dão todo o apoio. Essas meninas, mesmo sendo portadores de um pênis, crescem lindas e estudam normalmente com suas colegas de classe até chegar á faculdade. O segredo é só seu, vive seu enigma sexual e todas imaginam que trata-se de uma menina ainda virgem, que de certa forma é verdade. Da faculdade saem formadas arquitetas, médicas, advogadas, professoras, artistas, etc. Muitas, com o apoio da família, já fizeram a operação para mudança de sexo, mas a identidade continua sendo a grande barreira a ser vencida.
Na idade adulta, além das dificuldades para vencer numa profissão digna, a mulher que nasceu homem enfrenta uma luta ainda maior: provar que é mulher e mudar a identidade (RG). A justiça é o símbolo de lentidão que todos conhecem. É preciso não esmorecer, afinal esta é talvez a última barreira a enfrentar para ser plenamente feliz e realizada.
Na questão amorosa tudo pode acontecer. Os homens, na sua grande maioria, nem sob tortura algum dia confessarão, mas gostariam de sair com um travesti ou transexual. E não é raro acontecer que se apaixonem perdidamente; aí começa um outro drama: como sair do armário.
Mas a menina que nasceu menino quer ser mulher e ser tratada como tal. Ela é do "sexo frágil" e tem os mesmos sonhos de toda a menina: algum dia casar vestida de véu e grinalda, mesmo que não seja numa igreja, com um príncipe que vai lhe proteger pelo resto da vida.
Os estudos sobre o papel dos hormônios do sexo indicam que eles não apenas determinam a diferenciação dos órgãos sexuais (masculino ou feminino), mas também programam o cérebro durante o desenvolvimento do feto, para que no futuro ser venha demonstrar um comportamento masculino ou feminino, independente da formação do seu órgão sexual.
Os principais hormônios do sexo são segregados nos testículos do homem (testosterona) ou nos ovários da mulher (progesterona e estrógeno). As glândulas suprarrenais também segregam hormônios do sexo, inclusive pequenas quantidades de testosterona e androsterona - outro hormônio masculino- , bem como uma série de outros hormônios importantes como cortisol, cortisona e adrenalina.
Quanto mais os estudos avançam seus conhecimentos sobre as influências dos hormônios na vida, mais claro fica sua complexidade.
A verdade é que ambos os sexos produzem também hormônios do sexo oposto. Assim como o poderoso "beta-estradiol 17" -hormônio tipicamente feminino - pode ser encontrado na corrente sanguínea dos homens, também a testosterona - hormônio tipicamente feminino - pode ser encontrado na corrente sanguínea das mulheres. O que determina o comportamento de homem não é a ausência de estrógeno, mas sim, o elevado nível de testosterona que anula os efeitos dos hormônios femininos. Da mesma forma o comportamento tipicamente feminino é devido à prevalência de progesterona e estrógeno que anula a quantidade de testosterona presente naquele ser.
Tanto nos homens como nas mulheres a testosterona que parece ser o hormônio que têm maior influência sobre o instinto sexual. Pode até parecer absurdo que seja um hormônio masculino o responsável pelo instinto sexual das mulheres, mas na verdade é que várias pesquisas levam a essa conclusão. Por muito tempo se pensou que o comportamento sexual tivesse razões meramente genética. Isto é, o macho agirá como macho porque é geneticamente macho. Os estudos dos hormônios indicam que não é bem por aí.
A Importância dos hormônios do sexo não se limita ao período em que o ser atinge a puberdade. As pesquisas demonstram que os hormônios sexuais estão presentes no corpo desde o período de desenvolvimento pré-natal. As quantidades nas quais eles aparecem no útero são fundamentais não apenas para a diferenciação do sexo - isto é, para produzir um menino ou menina - , mas também para a diferenciação dos tecidos do sistema nervoso que regulará o comportamento masculino ou feminino na vida adulta. São exatamente essas quantidades que, quando estão em desequilíbrio, irão produzir um homem com comportamento feminino ou uma mulher com comportamento masculino. Diante desse fato, fica claro que o comportamento sexual de cada um é herança hormonal que vem desde a concepção e desenvolvimento no útero da mãe. Portanto nenhum pai ou mãe tem direito de discriminar, maltratar ou rejeitar o filho por essa razão. A criança que nasce bem feminina, mas com um pênis é a maior vítima do desequilíbrio hormonal e precisa de todo o apoio - dos pais e da sociedade - para superar as dificuldades e ser feliz.
O avanço da ciência neste campo traz consigo profundas mudanças na vida das pessoas. A química do sexo é muito poderosa e pode alterar a forma de vida, não apenas sexual, mas também social de qualquer um.
É preciso esclarecer também que o desequilíbrio hormonal não diminui em nada a importância que cada um tem para a sociedade como um todo.
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